Algumas
pessoas estranham o relato feito pelo evangelista Marcos da cura de um cego na
cidade de Betsaida realizada por Jesus. Parece-lhes incompreensível o fato de
Cristo ter precisado agir duas vezes, colocando-lhe as mãos nos olhos, para que
a cura fosse plenamente realizada pelo Senhor.
O
evangelista nos relata que ao chegar Jesus e seus discípulos na cidade de
Betsaida, algumas pessoas trouxeram a ele um cego para que fosse curado. Jesus,
então toma o cego pela mão, leva-o para fora da aldeia e aplica-lhe saliva aos
olhos e, impondo-lhe as mãos pergunta: “Vês alguma coisa? ” (Mc. 8. 22-23).
Normalmente
o primeiro questionamento que surge ao lermos esse texto se deve ao fato de que
em diversas outras passagens bíblicas, Jesus aparece curando a cegos e coxos
apenas com uma palavra, mas nesse relato o Senhor precisou usar saliva e impor
as mãos para realizar a cura. Outro questionamento que surge é o fato de Cristo
ter perguntado àquele homem se ele via algo, como se não soubesse do seu poder.
Algo diferente
Voltando
ao relato do evangelista Marcos vemos que o homem, recobrando a vista,
respondeu a Jesus: - Vejo os homens, porque como árvores os vejo andando (Mc.8. 24). “Então, novamente lhe pôs as mãos nos olhos, e ele, passando a ver
claramente, ficou restabelecido; e tudo distinguia de modo perfeito. E mandou-o
Jesus embora para casa, recomendando-lhe: Não entres na aldeia”. (Mc. 8.25-26).
Percebamos
que o texto demonstra que foi preciso Jesus pôr as mãos nos olhos do cego duas
vezes para que lhe fosse restabelecida a visão plenamente.
Em
primeiro lugar é preciso esclarecer que esta não foi a única vez que Jesus não
se utilizou apenas da Sua palavra para efetuar uma cura. Vemos outro relato da
cura de um cego no capítulo 9 do evangelho de João, onde Jesus também se usa da
Sua saliva para fazer uma espécie de lodo e aplicar nos olhos daquele homem
para lhe restaurar a visão. (Jo. 9. 1-7).
Para
compreendermos melhor esse relato precisamos de algumas informações da cidade
de Betsaida, onde ocorreu o milagre, bem como analisar alguns detalhes, as
vezes não percebidos por alguns, do próprio texto.
Historicamente
não dispomos de muitas informações sobre essa cidade, até mesmo sua existência
gera discussões entre os estudiosos, pois alguns acreditam que existiam duas
cidades de nome Betsaida, sendo uma a cidade natal de Felipe, André e Pedro (Jo. 1.44) e outra próxima ao local onde Jesus fez o milagre da multiplicação
dos peixes para cinco mil pessoas (Lc. 9. 10-17), enquanto outros pesquisadores
afirmam que só havia uma Betsaida.
Betsaida
Fiquemos
então com o que a Bíblia relata sobre a cidade onde Cristo realizou o milagre
da cura desse homem cego. Embora fosse a cidade natal de Felipe, André e Pedro,
encontramos no capítulo 10 do evangelista Lucas as seguintes palavras de Jesus:
“Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sidom, se
tivessem operado os milagres que em vós se fizeram, há muito que elas se teriam
arrependido, assentadas em pano de saco e cinza. Contudo, no Juízo, haverá
menos rigor para Tiro e Sidom do que para vós outras. ” (Lc. 10.13 - 14).
O
Senhor então revela-nos a impenitência dessas cidades, chegando a compara-las
com Tiro e Sidom, cidades contra as quais caiu a ira do Senhor, conforme as
profecias de Isaias, Ezequiel, Joel, Amós e Zacarias.
Percebemos
que Betsaida era uma cidade onde não havia o temor ao Senhor; e onde não há o
temor a Deus não há sabedoria (Pv. 1.7) e reina o materialismo, o pecado e o
caos.
Aquele
homem estava nesse ambiente e já tinha construído amizades, talvez família,
porque alguém o levou até Jesus (Mc. 8.22). Ele já estava adaptado ali.
Quantos de nós deixamos o nosso lugar, o nosso primeiro amor, para vivermos de ilusão, achando que conhecemos a verdade...
Jesus
então retira-o daquele local, daquele ambiente nocivo para ele (Mc. 8.23) e
passa a realizar a cura. Mas para quem passou muito tempo na escuridão, não
apenas da cegueira física, mas também da cegueira espiritual, pois tudo o que
conhecia provinha do que ouvia ou sentia naquela cidade impenitente,
descortinar o mundo real claramente fora daquele lugar certamente lhe causaria
dor.
Jesus,
tal qual um médico amoroso, abre seus olhos parcialmente e o faz perceber que
agora sim, estava vendo e conhecendo, pois antes apenas pensava que conhecia. Jesus,
então restabelece a visão daquele homem por completo e conclui Sua obra quando
o manda de volta para casa e recomenda: “Não entres na aldeia” (Mc. 8.26).
Aquele
homem não era dali, não era daquela Aldeia, ele não estava em sua casa, estava
fora do seu lugar. Jesus o manda de volta para casa. Ele o retira do pecado e
diz: volta para casa Meu filho.
Foi
preciso Jesus retirar aquele homem do ambiente de incredulidade onde vivia,
para fazê-lo ver que tudo o que achava que conhecia do mundo era ilusão e
quando o homem passou a “distinguir tudo perfeitamente” (Mc. 8.25) Jesus o
mandou voltar para o seu lugar e abandonar o pecado da incredulidade.
Quantos
de nós deixamos o nosso lugar, o nosso primeiro amor, para vivermos de ilusão,
achando que conhecemos a verdade, sem saber que tudo o que “vemos” é engano?
Peçamos,
pois, a Jesus que também nos abra os olhos para que possamos enxergar o caminho
de volta ao nosso lugar.
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